“Obrigada”, “por favor”, “por gentileza” parecem ser vocábulos que não fazem mais parte do nosso dia-a-dia nos grandes centros urbanos. A correria, o trânsito caótico, os transportes públicos sempre cheios, a competitividade, vão tirando a sensibilidade, nos fazendo perder aquele olhar cordial. Tudo fica mais rude. Nesse dia da Gentileza Urbana, data criada em São Paulo pela Lei Municipal 16.027/2014, vale refletir sobre como podemos ainda reverter esta situação.
Tenho pensado muito sobre isso já que trabalho, essencialmente, com comunicação humana. Fico atenta aos comportamentos e procuro praticar a gentileza, mas também sou uma pessoa urbana. Imaginem que ao entrar em um taxi na Vila Mariana, obviamente falando ao celular, deparei-me com um senhor simpático, mas pouca atenção dei a ele, dizendo apenas onde seria o meu destino. Continuei minha conversa de negócios. Sempre me julguei de natureza gentil e ao terminar a conversa pedi desculpas ao taxista pelo meu modo como entrei em seu veículo. “Sabe que pelo menos a senhora me pediu desculpas, mas a maioria nem me olha. O paulista se tornou muito egocentrado, sem olhar para o outro.”
Admirei-me com a opinião dele e quis saber mais. Este senhor havia morado no Japão por 15 anos e ao retornar recentemente para São Paulo, comprou um taxi se deparou com um paulistano apressado, ocupado, menos interativo, portanto, menos cordial. Estava assustado com esse novo comportamento de uma cidade que já foi considerado gentil. Em 2007 a Revista Reader´s Digest realizou uma pesquisa com várias capitais no mundo e considerou que São Paulo era a quinta cidade mais cordial entre outras 35 cidades de vários países, ficando atrás apenas de Nova York, Zurique, Toronto e Berlim. Se repetirem essa pesquisa novamente será que estaremos na mesma posição?
Os atos de gentileza não são meros comportamentos obrigatórios no relacionamento interpessoal. Eles têm uma função comunicativa de demonstração de respeito com o outro e ajudam a estabelecer uma conexão verdadeira. Segundo o livro do professor italiano Forni, da Universidade John Hopkins, nos EUA, que avaliou a importância da civilidade, das boas maneiras e da educação na sociedade contemporânea, a cordialidade gera um bem-estar individual, reduz a ansiedade e o estresse nos relacionamentos, aumenta a produtividade nos ambientes corporativos, além de uma vantagem social: nos tornar mais atraentes (Forni, P.M, 2011). José Datrino, nosso profeta Gentileza, paulista erradicado num grande centro urbano, o Rio de Janeiro, já profetizava que “Gentileza gera gentileza”.
A expressão de gentileza pode se dar por meio dos seus gestos, de um olhar positivo, um sorriso sincero ou um levantar-se para ceder lugar. O tom melodioso da nossa voz também pode expressar nossa consideração ou não pelo outro: o falar forte é invasivo, agride e afasta; a voz entoada aproxima e expressa acolhimento. A neurociência reforça que as palavras também têm grande poder: desejar um “bom dia” verdadeiro, e não aquele de canto de lábio, no elevador de seu prédio, pode aproximar um bom vizinho.
Vale lembrar que tudo isso é ainda mais necessário nas nossas relações profissionais. Ministrando treinamentos de Comunicação Assertiva ou Humanização da Comunicação nas empresas ouço colaboradores dizerem: “Mas isso que você nos ensina é para todos? Por que muitas vezes nem bom dia recebemos de nossos líderes” Então, líderes? As metas, as reuniões, os projetos não podem nos afastar de nossas equipes a ponto de esquecermos de olhar nos olhos destas pessoas, desejar-lhes um bom trabalho, questionar com interesse genuíno se estão bem ou até mesmo prestar um favor. A comunicação gentil é feita de pequenos atos de doação, de uma pequena parte de sua atenção, para um grande efeito na vida de alguém. Mas numa cidade agitada, deixamos esses detalhes de lado. Então, que o Dia da Gentileza Urbana floresça essa reflexão. Excelente Dia da Gentileza Urbana para todos.
Ana Elisa Moreira-Ferreira
Diretora executiva da Univoz